domingo, 29 de março de 2009

As sobras de tudo que chamam lar

Nunca tinha se sentido tão fora de casa. E a ironia maior de todas era estar no local que por muito tempo chamou de lar.
Era engraçado como as coisas mudavam. Assim, de uma hora pra outra. E agora nada se encaixava, muito menos ela. Iria rir disso mais tarde. Não agora.
Olhou pra sala. Pensou em levar os cds. Aquelas músicas que embalaram tantas noites regadas à vinhos e olhares apaixonados, que eram colocadas e exigiam atenção. Ou ainda as discussões. Desistiu.
Pensou em levar os livros, como deixá-los? Mas o que fazer com as pétalas das flores mortas que tinha ganhado, e que estavam imortalizadas naquelas folhas? E aquelas frases que tanto foram repetidas um para o outro? Eles ficariam.
Fotos? Já não haviam. E mesmo que houvessem, já haviam memórias suficientes para encher vários quadros. Quer se quisesse, quer não.
Passou pela cozinha e seu cheiro de ervas e madeira, tão familiar, tão de outra era, que doeu.
Olhou a banqueta do banheiro, com suas escovas de duas cores, aquele gel de barba que era o único que não causava alergia, e o shampoo especial, que sempre causava briga pelo preço. O espelhinho de maquiagem com respingos de espuma de barbear, a colônia com a tampa do lado, a escova com fios de uma cor diferente. Nada dali.
Chegou na porta do quarto. Parou. Haveria algo ali que gostaria de colocar numa caixa, que já não estivesse consigo, no peito? Haveria uma razão para entrar ali?
Nunca concordou tanto com Cartola ou Chico.
Daquele amor, ela levaria só o cinismo, e com a leve impressão de que já ia tarde.

* As músicas são a melhor coisa do post ;)

sábado, 21 de março de 2009

You girl is lovely, Hubble

Eu sempre tenho que dizer o mais difícil, eu sempre tenho que dar o passo mais pesado.
E isso me cansa tanto.
As coisas só deveriam ser mais viáveis, às vezes.
E isso tudo é um saco.

quinta-feira, 12 de março de 2009

A melhor forma de enxergar no escuro é com as mãos

Queria lembrar de um texto que li sobre fé. Não sobre fé ligada à religião, crença. Não, nada disso. Isso é algo bem mais/menos pessoal do que eu estava pensando.
Mas voltando. É sobre ter fé em certas coisas.
Eu estou com dificuldade em acreditar, em ter fé em certas coisas. Eu quero, eu quero muito. Mas simplesmente é tão difícil só ter fé. Só acreditar, sem ter nada que te mostre que estás certa (em termos), sem o tangível (maldita palavra).
É tão difícil só acreditar que um dia as coisas vão ser brancas, quando tudo está multicolorido.
É difícil só ter fé. Só acreditar. Às vezes, eu acordo totalmente sem fé nas coisas. Totalmente cética, totalmente incrédula. Não consigo acreditar, não consigo ver a tal silver line, não dá, não dá, n ã o d á !
A única coisa que dá vontade de fazer é gritar. Mas se eu gritar, meu grito será mudo pro meu corpo, mas tão alto pra minha alma, que tenho certeza de que ficarei surda.
Acordo sem acreditar no que eu prego, acordo sem ver o que tá na minha agenda, acordo sem entender o que dizem as palavras que eu gosto de ler. Eu simplesmente não acredito. Simplesmente, olho e torço o nariz, olho e nego três vezes. Olho, olho, olho. Não registro, não bate, não faz sentido.
Aí me dá uma gama de sentimentos. A crença que antes me inundava dá lugar pra descrença no amanhã, a frustração pelos planos que faço e acho que nunca vão se concretizar, a raiva por achar que acreditei no ar, e a tristeza. Sim, eu fico triste, porque eu quero acreditar e não consigo. Tudo parece ser tão distante, tão complexo, tão longe do meu alcance que eu não consigo mais acreditar que seja possível. E eu quero tanto.
Me sinto como Hércules: eu mato uma cabeça, e lá vem uma outra, e fico assim, me sujando, me estarfando, procurando, tentando, buscando e... E? E...!
E nada vem. É como nadar num lago congelado. Eu chego no topo, mas o topo está com gelo, eu bato, eu vejo do outro lado, mas não consigo ultrapassar aquela camada fina e transparente. Aquela camada sou eu. Aquela camada é a minha incredulidade, é minha falta de fé. E eu estou batendo nela, com meus punhos. É tão angustiante.
E não vou parar de bater.
Têm dias que eu acordo sem fé. Mas nem por isso, eu vou deixar de tentar romper isso.
Meu grito pode ser surdo, mas eu continuo gritando. Alguma hora, alguma coisa acontece.
Eu posso acordar sem fé, mas nem por isso vou deixar de tentar.